Colaboradores - Ruvin Singal

Grande Sertão: Veredas

19 de Setembro de 2017

Fomos prestigiar a obra prima de Guimarães Rosa, Grande Sertão: Veredas, sob a batuta de Bia Lessa, no Sesc Consolação, em São Paulo.

O espetáculo nos remeteu ao Sertão de Guimarães e lá pudemos apreciar um pouco dessa obra antológica e atemporal. O público pode fazer um passeio no imaginário. A música de Egberto Gismonti, nas interpretações precisas de Caio Blat e Luiz Lemmertz, trouxe o conhecimento ao universo de Riobaldo e Diadorim.

Maravilhoso.... quase 3 horas de pura magia emoção.

Imperdível. 

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Como transpor ao palco uma leitura da maior obra literária brasileira do século XX? Mais que uma pergunta, esta foi a missão da diretora teatral Bia Lessa ao decidir coisificar os universos contidos em Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa, e as inúmeras possibilidades de análise do romance. A resposta é fruto de um processo que durou quatro meses de trabalho diário com o elenco e serárevelada ao público, no próximo dia 09  de setembro (sábado), em uma realização do Sesc São Paulo, na área de convivência da unidadeConsolação. Com o apoio do Ministério da Cultura, através da Lei de Incentivo à Cultura, o projeto conta com o patrocínio do Banco do Brasil, da Globosat e o apoio do Instituto-E | Om Art.

 

No elenco, Caio Blat, Luíza Lemmertz, Luísa Arraes, Leonardo Miggiorin, Leon Góes, Balbino de Paula, Daniel Passi, Elias de Castro, Lucas Oranmian e Clara Lessa. Para dar vida ao mítico sertão, Bia reuniu nomes como Egberto Gismonti (música)Camila Toledo (concepção espacial, com a colaboração de Paulo Mendes da Rocha), Sylvie Leblanc (figurinoe Fernando Mello da Costa (adereços)A temporada paulista vai de 09 de setembro a 22 de Outubro. Após São Paulo, o espetáculo segue para o Rio de Janeiro, no Centro Cultural Banco do Brasil, para temporada de janeiro a março de 2018.

 

Contar seguido, alinhavado, só mesmo sendo as coisas de rasa importância.

 

Bia conhece profundamente o Sertão de Guimarães Rosa. Ela levou o público para dentro da obra na inauguração do Museu da Língua Portuguesa (SP), em 2006. A exposição foi aclamada por onde passou. Agora, ela convida a plateia a um mergulho fundo na epopeia narrada pelo jagunço Riobaldo (Caio Blat), que atravessa o sertão para combater seu maior inimigo, Hermógenes (Leon Goes), fazer um pacto com o diabo e descobrir seu amor por Diadorim (Luíza Lemmertz). Trata-se de uma instalação, visitada e experimentada pelo público diariamente na área de convivência do Sesc Consolação, e o espetáculo, encenado na mesma estrutura, e2 horas e 40 minutos de encenação ininterruptas, com o elenco em cena permanentemente, em que o blico experimenta a dissolução das fronteiras entre início e fim do espetáculo; entre teatro, cinema e artes plásticas; entre literatura e encenação.

 

O teatro para mim é sagrado. Me dedico a ele de tempos em tempos, não me sinto com capacidade de realizar espetáculos um após o outro. Me deparei com o Grande Sertão e ele se apoderou de mim mais uma vez. Quando montei a exposição, algumas questões se apresentavam: a principal delas era como utilizar imagens sem que o significado do Sertão de Guimarães ficasse reduzido a um único lugar. A opção na época foi trabalhar apenas com palavras. No teatro, essa questão volta a se impor: 'o sertão está dentro da gente'. Nosso caminho foi realizar um trabalho onde homens, animais e vegetais estabelecessem uma relação de diálogo sem supremacia entre eles. Não estamos exatamente no sertão, mas num espaço “ecológico” e metafísico onde tudo cabe. Um espaço, uma imagem, que nos possibilita a experiência proposta pelo romance, sem obviamente realizar o romance tal como é – fidelidade absoluta (todas as palavras ditas são de Guimarães Rosa), mas liberdade infinita, visto que é apenas uma das leituras possíveis da riquíssima obra de Guimarães. Escolhemos não utilizar grandes efeitos ou recursos, a não ser a valorização do universo sonoro dos espaços propostos pelo romance, apenas os próprios atores”, pontua a diretora.

 

O sertão está em toda parte

 

A grande estrutura tubular concebida lembra um claustro, uma gaiola. Instalada na área de convivência do Sesc Consolação, tambéé, ao mesmo tempo, cenário de violentas batalhas e de reflexões profundas. Como instalação, poderá ser visitada diariamente. 250 bonecos de feltro com tamanho humano, criados pelo aderecista Fernando Mello da Costa, confeccionados com apoio do Instituto-E | Om Art, compõem uma imagem permanente: a cena da morte de Diadorim como um presépio, passível da participação do público, não só como espectador, mas também como agente da ação, ocupando o lugar da personagem. A trilha sonora completa a atmosfera do Grande Sertão: Veredascomposta por três camadas: os ruídos e sons ambientes, a música composta por Egberto Gismonti e a trilha sonora que representa nossa memória emotiva, com músicas que fazem parte de nosso imaginário. Os figurinos são uma leitura do sertão, sem regionalizá-lo – são personagens do mundo.

 

Em um trabalho tão artesanal, marca da diretora (que passou mais de 600 horas com o elenco, em ensaios diários desde 01 de maio), ede grande esforço sico (a preparação corporal foi um dos aspectos indissociáveis do trabalho de direção, com aulas de corpo por Amalia Lima diariamente durante os 4 meses de ensaio), a tecnologia foi fundamental para guiar o público em tantas veredas. Cada espectador usará fones de ouvido que permitirão escutar separadamente a trilha sonora, as vozes dos atores, os efeitos sonoros e sons ambientes, levando-o a um nível inédito de interação com a dimensão sonora do espetáculo. Apesar de todos compartilharem o espaço na plateia, cada um terá uma experiência única durante a apresentação.

 

Essas são as horas da gente. As outras, de todo tempo, são as horas de todos

 

No Grande Sertão há uma noção particular de tempo. A gente estreia dia 9 de setembro e ele segue acontecendo até o último dia da temporada, pois a instalação continua se transformando, o cenário vai estar em modificação continuamente, a obra de Guimarães que acaba com o infinito, conclui Bia Lessa que dedica o trabalho a Violeta Arraes.  

 

SINOPSE

 

Em montagem inédita na área de convivência do Sesc Consolação, Bia Lessa propõe a um só tempo uma peça de teatro e uma instalação em sua adaptação do livro Grande Sertão: Veredas –matriz do moderno romance brasileiro e obra-prima de João Guimarães Rosa. A peça traz para o palco a saga do jagunço Riobaldo que atravessa o sertão para combater seu maior inimigo, Hermógenes, fazer o pacto com o diabo e viver seu amor por Diadorim. O cenário-instalação estará aberto à visitação do público.

 

FICHA TÉCNICA

Concepção, Direção Geral, Adaptaçãe Desenho de Luz – Bia Lessa

 

Elenco – Balbino de Paula, Caio Blat, Daniel Passi, Elias de Castro, Leon Góes, Leonardo Miggiorin, Lucas Oranmian, Luisa Arraes, Luiza Lemmertz e Clara Lessa.

 

Concepção Espacial – Camila Toledo, com colaboração de Paulo Mendes da Rocha

sica  Egberto Gismonti

Colaboração – Dany Roland

Desenho de Som – Fernando Henna e Daniel Turini

Adereços  Fernando Mello Da Costa

Figurino  Sylvie Leblanc

Desenho de Luz  Binho Schaefer

Projeto de Audio – Marcio Pilot

Diretor Assistente: Bruno Siniscalchi

Assistente de Direção: Amália Lima

Direção Executiva: Maria Duarte

Produtor Executivo: Arlindo Hartz

Colaboraçã Flora Sussekind, Marília Rothier, Silviano Santiago, Ana Luiza Martins Costa, Roberto Machado

Idealização2+3 Produções Artísticas Ltda

Realização: Sesc, Ministério da Cultura, Lei de Incentivo à Cultura.

Patrocínio Master: Banco do Brasil

Patrocínio: Globosat.

Apoio: Instituto-E | Om Art

 

Agradecimento especial à viúva do Autor, a quem a obra foi dedicada, Aracy Moebius de Carvalho Guimarães Rosa, à Nonada Cultural e a Tess Advogados.

© Nonada Cultural Ltda.

 

SERVIÇO - GRANDE SERTÃO: VEREDAS

De 9 de setembro a 22 de outubro

Local: Sesc Consolação - Rua Doutor Vila Nova, 245 – Vila Buarque, São Paulo

 

Espetáculo

Estreia: 9 de setembro (sábado), às 20h30

Horários: Quintas a sábados e feriado, às 20h30. Domingos, às 18h30

Duração: 160 minutos

Ingressos: R$40,00. R$20,00 (meia-entrada: estudante, servidor de escola pública, +60 anos, aposentado e pessoa com deficiência). R$12,00 (credencial plena: trabalhador no comércio de bens, serviços e turismo matriculado no Sesc e dependentes). Ingressos à venda pelo Portal sescsp.org.br e nas bilheterias do Sesc São Paulo.

Capacidade: 160 espectadores

Classificação: 18 anos

 

Instalação

Visitação livre: a partir de 11 de setembro.

Horários: Segunda a quarta, 11h às 21h30. Quintas e sextas, 11h às 19h30. Sábados, 10h30 às 19h.

Capacidade: 100 pessoas

Classificação: livre

 

BIA LESSA – Bia Lessa é uma artista multifacetada, cineasta, diretora de teatro e ópera, exposições, ganhadora de vários prêmios. Suas obras são exibidas em vários países, como Alemanha, França e EUA. Criadora do Pavilhão Brasileiro na Expo 2000 em Hannover, Mostra Redescobrimento na Bienal SP, Reabertura do Theatro Municipal do Rio de Janeiro com a ópera Il Trovattore, Pavilhão Humanidades 2012 (Rio + 20), reinauguração dos painéis Guerra e Paz de Candido Portinari na ONU em NY. No cinema, dirigiu os filmes CREDE-MI mostrado em festivais internacionais (Berlim, Biarritz, Nova Iorque, Jerusalem, Brisbane, Minsk, entre outros).

 

  

POR SILVIANO SANTIAGO

 

Para Bia Lessa, só o espetáculo teatral pode expandir a forma inovadora da literatura. Ela não adaptou duas obras clássicas do romance ocidental; levou ao palco os romance Orlando, de Virginia Woolf, e O homem sem qualidades, de Robert Musil, expandindo-os. E agora, quando a nação perde o norte da cidadania e esfarela a vontade dos brasileiros, Bia monta uma escultura na área de convivência do SescConsolação. No seu interior, encena o monstruoso e genial Grande sertão: veredas, do nosso Guimarães Rosa.

 

Durante o dia, a escultura do Grande sertão: veredas repousa como se fosse livro fechado, a espicaçar a curiosidade dos visitantes. À noite, a escultura expande o livro aberto. O leitor silencioso e introspectivo se metamorfoseia em espectador, parcela de um coletivo atento e participante, que se renova.

 

A gongórica e letal escrita de Rosa ganha o corpo dos atores. Empresta-lhes ação e fala. E a trama romanesca se desenvolve diabolicamente, com movimentos desordenados, afetuosos e anárquicos, qual máquina escultural assinada por Jean Tinguely, um dos fundadores do Novo Realismo. Novo Realismo igual a − diz o famoso manifesto − novas percepções do Real.

 

Grande sertão: veredas se expande como espetáculo teatral que libera – qual alegoria rigorosa da nossa contemporaneidade − o modo como os movimentos desenvolvimentistas sem preocupação social e humana não recobrem a nação como um todo. Pelo contrário. O esforço positivo da modernização é localizado, centrado e privilegia. Nas margens, cria enclaves de párias – bairros miseráveis, favelas, prisões, manicômios, etc. − onde violentas forças antagônicas se defrontam e se afirmam pela ferocidade da sobrevivência a qualquer custo, acirrando a irascibilidade do controle e do mando. Viver é perigoso.

 

Extraordinário em Guimarães Rosa é que, no mais profundo da vida humana miserável e autodestrutiva, na morte, há lugar para o afeto e o amor. Ao compasso de espera, Riobaldo e Diadorim dançam novos e felizes tempos. Piscam a alegria de viver, como vagalumes que a mata libera à noite.

Abaixo - Colunista ruvin com as celebridades da peça.
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