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Foto: Divulgação/ IA |
Ao longo da última década, os sistemas de fiscalização eletrônica nas vias brasileiras se tornaram onipresentes. De avenidas urbanas a estradas federais, radares de velocidade compõem hoje uma paisagem comum, simbolizando tanto a promessa de segurança viária quanto o temor de penalizações automáticas. O que poucos condutores sabem, no entanto, é que existe um instrumento oficial, público e digital, que permite confrontar essas autuações à luz da conformidade técnica: o PSIE, portal do Inmetro.
Com um nome pouco conhecido — Portal de Serviços do Inmetro nos Estados —, o PSIE permite que qualquer cidadão consulte se um radar estava ou não em situação regular no momento da autuação. Essa verificação se tornou cada vez mais relevante diante de inconsistências verificadas em campo: equipamentos vencidos, fora de especificação, ou mesmo sem registro atualizado no órgão metrológico. A consulta, embora não anule automaticamente uma multa, representa um dado técnico de alto valor jurídico e crescente utilização em defesas administrativas.
Guia Passo a Passo para Verificação
Verificar se um radar está dentro das normas do Inmetro é uma tarefa simples que pode ser realizada pelo site do PSIE. A seguir, apresentamos um guia passo a passo para ajudar nesse processo.
● Acesse o site do PSIE (Portal de Serviços do Inmetro nos Estados).
● Na página principal, procure a opção “Consulta de Instrumentos”.
● Selecione o “Tipo de Instrumento”, escolhendo “Medidor de Velocidade”.
● Insira o endereço do local em questão, de acordo com os detalhes da multa recebida.
● Clique em “Consultar” para acessar os dados do radar.
O valor jurídico da aferição metrológica
A legislação brasileira estabelece critérios rigorosos para a utilização de instrumentos de medição que gerem consequências legais, como é o caso dos radares de velocidade. A Resolução Contran nº 798/2020, por exemplo, exige que todos os equipamentos estejam devidamente aferidos e aprovados pelo Inmetro, cuja fiscalização é descentralizada por meio dos Institutos de Pesos e Medidas (IPEMs) estaduais. Radares com aferições vencidas ou não conformes são, do ponto de vista técnico, inaptos a produzir prova válida.
"Verificar o radar no PSIE revela se a multa tem base legal. Isso fortalece sua defesa e reforça a importância da transparência na fiscalização", contou Alan Correa, jornalista automotivo do Carro.Blog.Br.
No entanto, muitos órgãos de trânsito continuam a utilizar equipamentos sem observar a conformidade exigida. É aí que entra o PSIE: a plataforma, acessível online, permite consultar o status técnico de cada medidor com base nos dados da infração — como a via, município e estado. A resposta do sistema pode indicar “aprovado”, “reprovado” ou ausência de registro. O último caso costuma ocorrer quando o radar é muito antigo ou foi desativado sem atualização de sistema, o que por si só não comprova irregularidade, mas já levanta uma hipótese válida para investigação adicional.
Funcionamento prático e confiabilidade da consulta
O processo de consulta é direto: no site do PSIE, o usuário seleciona a opção "Consulta de Instrumentos", depois "Medidor de Velocidade", e preenche os campos exigidos com base na notificação recebida. A interface retorna dados técnicos que incluem o número de série, tipo do equipamento, responsável pela verificação e o status da última aferição. Se o radar estiver reprovado ou com aferição vencida, essa informação pode ser anexada ao recurso administrativo com base no artigo 281 do Código de Trânsito Brasileiro, que determina a nulidade de infrações quando os elementos que as comprovam são insuficientes ou irregulares.
A confiabilidade do PSIE deriva da integração com o Sistema Nacional de Metrologia Legal, sendo atualizado pelos IPEMs e fiscalizado pelo próprio Inmetro. A existência do portal representa um avanço na transparência da fiscalização e, ao mesmo tempo, impõe aos órgãos autuadores a necessidade de manter equipamentos em situação absolutamente regular, sob pena de nulidade de atos administrativos.
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Foto: Divulgação/ IA |
Estratégia de defesa e jurisprudência emergente
Nos últimos anos, advogados especializados em direito de trânsito têm utilizado laudos do PSIE como pilar central em defesas contra autuações. A argumentação jurídica é reforçada por precedentes crescentes em julgados dos Conselhos Estaduais de Trânsito (CETRANs) e até no Poder Judiciário, reconhecendo que multas oriundas de equipamentos fora de conformidade são tecnicamente insubsistentes. Em muitos casos, o simples fato de o radar estar “reprovado” na última verificação já basta para o deferimento do recurso.
Contudo, para que o pleito tenha sucesso, é essencial apresentar o recurso dentro do prazo e incluir todos os elementos de prova disponíveis, como cópia da notificação, fotos do local e, se possível, imagens do radar. O laudo do PSIE, por si só, pode não ser suficiente em casos mais complexos, principalmente quando o equipamento aparece como "aprovado", mas instalado fora dos padrões estabelecidos por normas técnicas, como altura, ângulo ou sinalização deficiente.
Limitações, desafios e recomendações
Apesar de sua utilidade, o PSIE possui limitações. Equipamentos novos, ainda sem cadastro completo, ou muito antigos, podem não constar no sistema. Também há dependência da atualização correta dos dados pelos IPEMs estaduais, o que pode gerar atrasos ou omissões. Ainda assim, o Inmetro recomenda que, na ausência de resultado na consulta, o cidadão entre em contato diretamente com o órgão metrológico do estado para obter histórico detalhado do equipamento, o que pode ser feito por meio de protocolo formal.
Importante notar que nem toda inconsistência identificada no PSIE levará à anulação da multa. O uso da ferramenta deve ser interpretado como parte de uma estratégia de defesa mais ampla, onde o princípio do contraditório e da ampla defesa é exercido de forma plena e fundamentada.
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Foto: Divulgação/ IA |
Fiscalização como política pública e controle social
O debate sobre a regularidade de radares não diz respeito apenas a autuações individuais, mas à legitimidade do modelo de fiscalização eletrônica como um todo. Sistemas automatizados de penalização devem operar sob máxima legalidade, com auditabilidade plena e controle externo. Nesse sentido, o PSIE representa uma interface crucial entre o cidadão e o Estado, permitindo que qualquer autuado questione, de forma fundamentada, a estrutura técnica por trás da multa recebida.
Esse tipo de transparência é vital para a consolidação de políticas públicas de trânsito que sejam percebidas como justas, eficazes e confiáveis. Um radar irregular não apenas compromete a validade de uma autuação, mas também abala a credibilidade de todo o sistema fiscalizatório. O acesso a dados técnicos de forma pública e gratuita é, portanto, mais que um serviço — é um direito que fortalece o exercício da cidadania e a própria noção de justiça administrativa.